Texto Bíblico
“Portanto,
orai vós deste modo: Pai nosso que estás nos céus, santificado seja o teu nome;
venha o teu reino, seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu;
o pão nosso de cada dia nos dá hoje;
e perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós também temos perdoado aos nossos
devedores;
e não nos deixes entrar em tentação; mas livra-nos do mal. {Porque teu é o
reino e o poder, e a glória, para sempre, Amém.}” Mateus
6:9-13
Não há nada de
circunstancial, acaso ou aleatório nos atos da Trindade Divina. Nada que a Trindade, isto é, Deus
Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo fez, faz e fará é desprovido de
propósito. Há sabedoria em cada palavra,
em cada ação. Todos no mundo estão a serviço de Deus, quer acreditem na existência
Dele ou não, nada escapa à Soberania da Trindade.
A
Bíblia Sagrada não está aqui no mundo para provar a existência de Deus, mas o
propósito de Deus é que a Bíblia contenha a revelação que Ele fez de si mesmo,
a história da vida de Jesus, o Deus encarnado, a revelação máxima do Pai aos
homens caídos no pecado. O mistério que reside nas Santas Escrituras é que não
há revelação na simples leitura desse livro, não se algo estiver faltando. A
Bíblia por si só, sem a revelação que o Espírito Santo de Deus faz não tem nada
de novo a acrescentar. Não se encontra
Deus sozinho, por esforço próprio. É preciso que o Espírito Santo de Deus
revele o mistério contido nas Escrituras, é preciso fé.
A oração do Senhor, ou Oração do Pai Nosso, como muitas
vezes é chamada, é conhecida por todos
nós. Todos nós, evangélicos ou não, participamos em algum momento da nossa
vida de uma reunião em que a Oração do Senhor foi declamada. Como
se fosse um mantra ou um simples poema bonito e universal, todos se dão as mãos
e repetem mecanicamente palavras extraídas de um livro santo. Trechos da Bíblia
Sagrada, repetidos de forma aleatória, sem propósito, vazios e sem significado.
Sem o Espírito Santo, não há valor nem aprendizado nas palavras ditas.
A Oração do Pai Nosso é
muito mais do que uma oração universal e ecumênica, ao ensiná-la aos seus discípulos, e a
nós através daqueles discípulos, Jesus, a segunda pessoa da Trindade, pretendia
muito mais, seus propósitos eram profundos e marcantes. Jesus estava ali a orar com seus discípulos, lado a lado com eles,
mostrando o que havia de errado com o homem e de que maneira o homem seria
redimido.
Nos
versículos anteriores aos lidos, antes de começar a ensinar a orar, Jesus
corrige aqueles homens, avisa-os que oração não é teatro, nem retórica, nem um
modo de impressionar os homens e a Deus. Oração
é o coração da vida com Cristo e ninguém vê o coração quando está trabalhando.
A
oração começa então com “Pai nosso, que
estás nos céus!”, Jesus inclui a si mesmo na oração. Estamos juntos, Jesus
não assume uma posição distanciada, ele se inclui conosco, ele não fala muito
sobre oração, ele ora conosco! A oração
não é solitária! Com a palavra “Pai”
Jesus nos chama atenção do perigo de impessoalizarmos Deus, transformando-o em
uma abstração. Deus é uma pessoa, é nosso Pai! Há relacionamento aqui, há
amor. “Pai” como metáfora dá nome a uma pessoa, não a um objeto. Pai e filho, e filha, não são funções. São
relações inigualáveis de sangue.
“Santificado seja o teu
nome ...” - Algo real
está acontecendo! Deus tem um nome! Em
todas as culturas, só possui um nome seres dotados de personalidade, vida e
pessoalidade. E Deus não é anônimo, Ele
se revela com um nome: Javé. Deus não é uma abstração, algo impessoal, Ele
tem um nome, podemos nos relacionar com alguém que tem nome e cujo nome nós
conhecemos. E esse nome é Santo!
Santidade é a qualidade inigualável de alteridade
(qualidade
do que é outro, o contrário de identidade)
que deixa Deus além e a parte de nós. Deus não é como nós. Não somos como
Deus. O primeiro pecado continua a ser o pecado mais fundamental, é
atrever-se a ser “como Deus” (Gn3.5). Tentamos fazer isso rebaixando Deus ao
nosso nível, reduzindo-o à nossa imagem, tomando
o seu santo nome em vão. Tentamos
assim nos livrar do santo. Quando oramos
pedindo que Seu nome seja santificado, estamos
pedindo que se remova das palavras usadas para chamar a presença de Deus
qualquer mancha de sacrilégio, para purificar das imagens que enchem nossa
mente de qualquer sugestão de idolatria até que Jesus e Cristo digam a verdade
clara acerca de Deus.
“Venha o teu Reino...” – Reino é uma metáfora para um mundo
governado por um soberano, um rei. Ao utilizar isso na oração abrangemos tudo e
a todos: geografia, clima, estações, pessoas e povos, sistemas políticos,
economias, tudo! As primeiras palavras
de Jesus quando lançou seu ministério púbico foram: “O tempo é chegado (...) O Reino de Deus está próximo” (Mc 1:15)
O Reino de Deus que Jesus anuncia como presente, aqui e agora compreende a tudo
e a todos. Não há nenhum outro mundo. Há elementos no mundo que estão em
rebelião contra o Reino. Há partes do mundo que desconhecem o Reino. Mas o que Jesus inaugura e proclama é realidade
atual e abrangente. Nada ocorre fora do Reino de Deus. Quando oramos “Venha o
teu Reino” identificamo-nos e oferecemo-nos como participantes neste mundo em
que Deus governa em amor e salvação.
Vivemos
num país democrático e nos consideramos afortunados por vivermos num governo
eleito, não imposto, que melhor atende à condição humana. Pode ser sim algo
bom, mas corremos o risco de pensar que
o melhor governo, incluindo o de Deus, funciona sobre bases democráticas, é
um hábito difícil de romper. Deus não é um presidente ou primeiro-ministro de
uma democracia. Deus é rei. “O Senhor reina; está vestido de majestade. O
Senhor se revestiu, cingiu-se de fortaleza; o mundo também está estabelecido,
de modo que não pode ser abalado. O teu trono está firme desde a antigüidade;
desde a eternidade tu existes.” Salmos 93:1-2. Deus é soberano.
Mas não há nenhuma analogia terrena ao trono e ao reinado de Deus. Não é
imposto, não é tirânico. Todas as nossas necessidades e anseios, nossas
lágrimas e desejos, nossas petições e louvores são absorvidos pelo reinado de
Deus. É uma soberania que convida nossa participação. A soberania
impaciente de um ditador não permite a não participação. A soberania de nosso
Pai pacientemente, misericordiosamente, espera uma obediência que adora. Compartilhamos seu reinado, mas é seu reinado. Muitas parábolas de
Jesus nos fornecem uma idéia desse reino, mas é um mistério como Deus exerce
sua soberania, pois o seu reino não é deste mundo. Cristo é rei, verdadeira e
literalmente, mas numa cruz.
“...seja feita a tua
vontade...” A terceira petição da oração está completamente
inserida no contexto da vida de Jesus. Maria orou essa oração quando recebeu a espantosa notícia da concepção
milagrosa, Jesus no Getsêmani fez a mesma oração. Ambas foram atendidas. Não podemos retirar
a oração “Seja feita a tua vontade” do contexto da vida de Jesus, para depois
usar como bem entendemos. A
expressão “a vontade de Deus” tem sido alvo de muitas interpretações erradas,
sem enraizamento bíblico. Muitas vezes é usada como apenas um clichê
desprovido de conteúdo. Mas a Bíblia é muito clara sobre o assunto. Usar a
palavra “vontade” em relação a Deus em nada difere do modo normal em que usamos
a palavra entre nós. Vontade
relaciona-se com intenção, com propósito. Paremos de especular sobre a
“vontade de Deus” e a simplesmente cumpramo-la, como fez Maria, como fez Jesus.
“Vontade de Deus” é uma questão de
obediência cheia de fé.
“...assim na terra como
no céu.” - O céu é o lugar onde tudo começa. O céu
é o lugar onde tudo termina. O céu é
a nossa metáfora para aquilo que está além de nós, além de nossa compreensão,
além do que podemos ver, ouvir, provar e tocar, além e fora do alcance daquilo
que podemos controlar. A terra é onde
desempenhamos a nossa parte, o lugar onde o que não vemos e o que vemos se
unem e se tornam criação, salvação e santidade. As realidades céu e terra se fundem: “...assim na terra como no céu.”
Na linguagem que aprendemos nas Escrituras e com Jesus, o céu e a terra são
distintos, mas não separados. O céu e a terra são uma unidade orgânica (diz
respeito a organismo, algo vivo que tem funcionamento). Nenhuma parede de ferro
os separa. Tudo no céu – a beleza, a bondade, as aleluias, os améns, a
santidade, a salvação, o cavalo branco e os 24 anciãos, o Cordeiro que foi
morto e as bodas, a cidade quadrangular e o rio da vida – tudo ocorre na terra.
A oração não é uma fuga do que está
acontecendo ao nosso redor. É uma participação corajosa em cada detalhe
terreno.
“Dá-nos hoje o nosso pão
de cada dia.” Somos
criaturas de carne e sangue, precisamos de pão para viver. Pão diário. Comida. Somos
seres humanos criados à semelhança de Deus, seres espirituais destinados à
glória celeste – mas a primeira coisa de que necessitamos é de pão, juntamente
com os princípios básicos associados ao abrigo, vestuário, etc. Não somos
anjos. Orar pedindo pão é o
reconhecimento da nossa necessidade. Temos um lugar na criação de Deus, onde
todos e tudo se relacionam. A oração que pede pão é a nossa declaração
de dependência. Mas não gostamos de depender de ninguém nem de nada. Quando
compramos o que precisamos, assumimos o controle de nossa vida. Substituímos um
senso de necessitar de algo por um senso de posse, e assim desaparece o senso
de precisão. Por isso o consumismo é o narcótico que cega a consciência de
estarmos em necessidade. O dinheiro anestesia nosso senso de necessitar
das coisas. Eles nos põem no comando, no controle. Mas as necessidades não
são limitações que nos prejudicam, rebaixam ou enfraquecem nossa vida. As necessidades preparam-nos para receber o
que só pode ser recebido como presente: a graça de Deus. Os limites não nos
limitam de sermos inteiramente humanos, eles nos limitam de sermos Deus. Nossas
necessidades são um convite contínuo a vivermos em uma realidade de doação de
presentes. “Peçam, e lhes será dado; busquem, e encontrarão; batam, e a porta lhes
será aberta” (Mt 7:7). Deus dá. A vida é um presente. Você
poderia nunca ter existido, mas você existe, porque a festa não estaria
completa sem você. Dar e receber é norma da criação de Deus: “Porque Deus amou o mundo de tal maneira
que deu...” (Jo 3.16).
“Perdoa as nossas dívidas, assim como perdoamos
aos nossos devedores.”
- A graça em que estamos imersos é continuamente obscurecida pelo pecado, o
oposto da graça. O pecado é antipresente
e antipessoal. O pecado rompe um relacionamento vivo. Em vez de receber,
tiramos à força. O mundo da graça, que requer de nós disposição para pedir
humildemente e receber gratamente, é deixado de lado em troca de um mundo
impessoalizado de manipulação, violência, eficiência e controle. As palavras
são impessoalizadas em propagandas, o sexo é impessoalizado em pornografia, a
política é impessoalizada em opressão, o poder é impessoalizado em guerra. É o
que mais fazemos, e assim, carecemos de perdão.
Pecado
não deixou de ser pecado no mundo do politicamente correto. Pecado é a palavra genérica para o que está
errado conosco e com o mundo. Parece não ter fim a criatividade com que a
humanidade trata mal o mundo e aos outros. Mas
desmascarar e classificar o pecado não estão no centro da vida vivida para a
glória de Deus. O sensacionalismo não é obra do evangelho. A condenação
dos pecadores não é a obra do evangelho. O perdão dos pecados é a obra do evangelho. Quando nos vemos diante
da confusão do pecado, Jesus ora conosco. Ele une-se a nós onde
estamos, atolados na lama do pecado “Aquele que não conheceu pecado, o fez pecado
por nós; para que nele fôssemos feitos justiça de Deus.” 2 Co 5:21.
Ele toma seu lugar ao nosso lado e nos convida a orar como ele: “Perdoa-nos...”
Deus trata do pecado perdoando-nos.
O
pecado mata. O pecado mata os
relacionamentos. Não pecamos contra um mandamento, pecamos contra uma
pessoa. O pecado não é uma violação da lei da terra ou das regras de uma casa; o pecado é uma violação de um
relacionamento pessoal (com Deus e com o próximo).
O
pecado mata a intimidade da alma inerente na criatura criada à imagem de Deus
que nós somos. O pecado é mortal, sintetizado nos “sete pecados mortais” (Gula,
Avareza, Inveja,Ira, Soberba, Luxúria, Preguiça). Parte de nós morre quando
pecamos. Não estamos mais numa relação
viva com o Deus vivo, com o cônjuge vivo, com o filho vivo, com o próximo vivo.
Não há remédios capaz de trazer os mortos de volta à vida. A única maneira de
tratar com o pecado é pela ressurreição. O perdão de Jesus Cristo é
ressurreição, é vida dentre os mortos. Não podemos fazer nada por nós mesmos em
relação ao pecado, somente a ressurreição traz de volta à vida aquilo que
morreu por causa do pecado. Somente a ressurreição de Jesus Cristo traz de
volta à vida aquilo que matamos com o nosso pecado.
Assim,
Jesus fica ao nosso lado e ora conosco: “Perdoa-nos”. E Ele confia que faremos o melhor possível naquilo que Ele faz de melhor:
“assim
como perdoamos aos nossos devedores.” Há uma conexão entre o que
Deus faz e o que você faz. Você não pode obter perdão de Deus se não perdoar os
outros. Se recusar a fazer sua parte você estará separado de Deus. Mas
Jesus Cristo, legitimamente te incentiva a perdoar, pois ele já montou o palco,
estendendo o perdão a todo aquele que se arrepende e crê.
“E não nos deixe cair em
tentação, mas livra-nos do mal...” –
As cinco primeiras petições são feitas a partir de uma atividade presente, de
Deus e nossa, das circunstâncias de nosso cotidiano. Mas há mais. A sexta petição estende-se para o futuro e
prepara-nos para aquilo que ainda não sabemos: tentações imprevistas e males
enganosos. Jesus nos une a ele em uma oração por algo que ainda não assumiu
nenhuma forma identificável e pode facilmente não ser reconhecido e percebido.
Mas Ele assegura-nos de que podemos contar com Ele para atender à nossa oração: “Eu
lhes disse essas coisas para que em mim vocês tenham paz. Neste mundo vocês
terão aflições; contudo, tenham ânimo! Eu venci o mundo". João 16:33
Perigos sem a aparência de
perigos estão por toda parte. Na maior parte dos casos, sabemos quando pecamos.
E, se não sabemos, nossos pais, filhos e vizinhos o sabem, e logo nos mostrarão
que sabem. Mas a tentação e a provação, os testes e o mal estão em uma classe
diferente. A tentação e o mal quase
sempre aparecem disfarçados como bons e bonitos e nos pegam desprevenidos, nos
tomando de surpresa. Uma pessoa boa em um lugar bom não é nenhuma garantia de
ausência de tentação, a história de
Eva no Jardim do Édem nos mostra isso. Uma
pessoa boa com uma boa obra não é nenhuma garantia de ausência de tentação, a
história de Jesus Cristo nos mostra isso. Nunca sabemos quando ou de que
maneira enfrentaremos a tentação, seremos provados ou nos veremos enredados
pelo mal. Assim, Jesus ora conosco pedindo a Deus que faça por nós o que não
somos capazes de fazer por nós mesmos.
“...porque teu é o Reino, o poder e a glória
para sempre. Amém.” – Com Jesus ao nosso lado, orando conosco, sabemos onde
estamos. Estamos prontos para seguir a Jesus sem indecisão. Tudo agora está nas
mãos do Pai, confiamos que Deus fará com nossas orações o que quer que
escolher, como e quando quiser. Todas as nossas intenções, nossas experiências
e nossa energia estão agora na oração. Há uma liberdade incrível em se entregar
e seguir a Jesus, pois o nosso futuro está nas mãos de quem tudo pode.
A oração do Senhor nos
envolve pessoalmente com a ação de Deus no presente. As palavras que usamos no dia-a-dia
são as mesmas usadas na oração. Jesus quando subiu ao céu nos enviou o
Consolador, o Espírito Santo que nos ajuda a orar quando não sabemos como orar.
Deixe que o Espírito Santo de Deus
renove sua linguagem para que suas orações sejam significativas e cheias de
propósitos, o propósito de Deus.
Arrependa-se e aceite Jesus Cristo como aquele
que te trará de volta à vida, trará de volta à vida os seus relacionamentos mortos
(com Deus e com o próximo), aceite Jesus como o seu salvador. E assim, você estará pronto para
retomar a intimidade com Deus, com o seu próximo e consigo mesmo, e viver uma
vida de liberdade e descanso.
Bibliografia: A linguagem de Deus - Eugene Peterson